Confidencialidade contratual
- Vandre Torres
- 14 de jun. de 2024
- 5 min de leitura
A importância da assinatura de um termo de confidencialidade (NDA) nos negócios

Introdução
A globalização e o avanço da tecnologia intensificaram a necessidade da proteção de informações sensíveis no ambiente corporativo. Empresas de diferentes setores compartilham, frequentemente, dados estratégicos com empregados, fornecedores, investidores e parceiros comerciais. Tais informações, muitas vezes, são essenciais para a manutenção da competitividade no mercado e, caso sejam indevidamente divulgadas, podem resultar em prejuízos financeiros e até mesmo comprometer a sobrevivência do negócio.
Nesse cenário, o termo de confidencialidade, ou non-disclosure agreement (NDA), surge como um instrumento jurídico crucial para garantir a proteção de segredos comerciais, dados estratégicos e informações sensíveis compartilhadas entre as partes. O NDA se baseia nos princípios da autonomia da vontade e da boa-fé contratual, elementos fundamentais do direito civil brasileiro que garantem a segurança jurídica para aqueles que necessitam proteger informações sigilosas em suas relações comerciais.
Fundamentação jurídica do NDA no ordenamento brasileiro
Ainda que o Brasil não possua uma legislação específica que regulamente os NDAs, a validade desses contratos está sustentada em diversos dispositivos legais. O Código Civil estabelece que os contratos devem ser pactuados respeitando os princípios da função social e boa-fé, conferindo legitimidade às obrigações de sigilo e confidencialidade acordadas entre as partes. A lógica contratual imposta por esse diploma legal permite que as partes estipulem obrigações recíprocas sobre a não divulgação de informações estratégicas, desde que tais disposições não contrariem normas de ordem pública.
Além disso, a proteção de segredos comerciais e industriais é assegurada pela Lei nº 9.279/1996, que dispõe sobre direitos e obrigações relativos à propriedade industrial. Essa legislação prevê que a divulgação indevida de informações sigilosas pode configurar concorrência desleal, sujeitando o infrator a penalidades civis e criminais. O artigo 195 dessa lei estabelece que a utilização ou a divulgação sem autorização de segredos empresariais obtidos de forma legítima ou ilegítima pode ser enquadrada como crime, garantindo maior proteção às empresas contra o uso indevido de suas informações.
Outro instrumento jurídico essencial para a fundamentação do NDA é a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (Lei nº 13.709/2018), que prevê diretrizes sobre o tratamento e a proteção de dados pessoais. Esse diploma normativo impõe às empresas a obrigação de adotar medidas que garantam a confidencialidade de informações sensíveis e determina sanções para aqueles que forem responsáveis por vazamentos ou uso indevido de dados. Dessa forma, a inclusão de cláusulas de confidencialidade em contratos que envolvem o tratamento de dados pessoais se torna uma medida necessária para evitar descumprimentos à legislação vigente.
Os NDAs também podem ser relacionados ao artigo 154 do Código Penal, no qual a violação de segredo profissional é tipificada como ilícito penal. Esse dispositivo estabelece penalidades para aqueles que, indevidamente, divulgarem informações confidenciais obtidas em razão do exercício de sua profissão ou atividade, reforçando a obrigação legal de manter o sigilo sobre determinados dados nas relações comerciais. Diante dessas normativas, o NDA se apresenta como um meio eficiente para formalizar e reforçar obrigações de confidencialidade dentro do ordenamento jurídico brasileiro.
Razões para a assinatura de um NDA
A assinatura de um NDA é essencial para diversas situações empresariais, especialmente naquelas em que há compartilhamento de informações proprietárias, estratégicas ou sensíveis. Entre os principais motivos para sua adoção, destacam-se:
§ Preservação de segredos comerciais e concorrência leal
O mercado competitivo atual exige que empresas protejam seus diferenciais estratégicos, como fórmulas, métodos de produção, estratégias de marketing e desenvolvimento tecnológico. A ausência de um instrumento que formalize a confidencialidade pode levar à apropriação indevida de tais informações por parte de concorrentes ou terceiros mal-intencionados, configurando um risco significativo para o empreendimento.
A legislação de propriedade industrial reforça a necessidade de proteger tais informações contra práticas desleais. A concorrência desleal é reprimida pelo ordenamento, pois o uso indevido de dados sigilosos pode causar danos irreparáveis à empresa que detém a titularidade dessas informações. A celebração de um NDA minimiza esse risco ao estabelecer regras claras sobre o uso e a divulgação das informações compartilhadas.
§ Segurança nas negociações empresariais e parcerias estratégicas
O NDA também é indispensável em processos de negociação de fusões, aquisições e parcerias estratégicas, nos quais as partes precisam trocar informações financeiras, operacionais e comerciais antes de firmar um acordo definitivo. Caso a negociação não concretize, um contrato de confidencialidade previamente assinado impede que as informações reveladas sejam utilizadas para beneficiar a outra parte ou prejudicar a empresa que as forneceu.
Se, por exemplo, uma empresa interessada em adquirir outra tiver acesso a informações privilegiadas sobre sua estrutura e clientes, e posteriormente desistir da transação, a ausência de um NDA pode permitir que essa empresa use tais dados para fins concorrenciais, resultando em prejuízos e vantagem indevida no mercado.
§ Proteção de informações sensíveis sob a LGPD
A proteção de dados pessoais tornou-se uma preocupação central para empresas que operam no Brasil, especialmente após a promulgação da Lei Geral de Proteção de Dados. Essa legislação exige que organizações tomem medidas para garantir a privacidade e a segurança das informações de seus clientes e funcionários.
A assinatura de um NDA entre empresas e terceiros que tenham acesso a dados pessoais é uma forma de garantir conformidade com o marco legal, além de proporcionar um mecanismo de prevenção contra eventuais sanções administrativas. Dessa forma, o contrato funciona como uma camada adicional de proteção, evitando vazamentos que possam resultar em penalidades severas.
Consequências da violação de um NDA
O descumprimento de um termo de confidencialidade pode resultar em diversas consequências jurídicas, incluindo sanções civis, administrativas e até criminais, dependendo da gravidade da violação.
No âmbito civil, a parte prejudicada pode ingressar com uma ação para exigir indenização por danos materiais e morais, além de solicitar medidas cautelares para evitar o uso indevido das informações. Em situações que envolvem propriedade industrial, a parte lesada pode requerer a cessação do uso comercial dos dados vazados, bem como a reparação pelos prejuízos causados.
Caso a violação estejam relacionada a informações protegidas pela legislação de proteção de dados pessoais, a empresa infratora pode ser responsabilizada pelos órgãos reguladores e receber multas elevadas, comprometendo sua reputação e estabilidade financeira.
No plano criminal, condutas que envolvam a apropriação indevida de segredos industriais ou informações estratégicas podem ser tipificadas como crimes contra a concorrência, sujeitando os responsáveis a investigação e punição conforme a legislação aplicável.
Conclusão
Diante da crescente relevância da proteção de informações estratégicas para o sucesso empresarial, a assinatura de um termo de confidencialidade se mostra fundamental para garantir a segurança dos segredos comerciais, dados estratégicos e informações protegidas por lei. O NDA não apenas fortalece a segurança jurídica das relações negociais, como também previne litígios e protege empresas contra riscos concorrenciais.
A utilização desse instrumento deve ser encarada como uma prática obrigatória em qualquer operação empresarial que envolva informações sensíveis, sigilosas ou estratégicas, garantindo que as partes se comprometam a agir com ética e respeito aos princípios legais que regem a confidencialidade no ambiente de negócios.
Vandré Torres
Advogado (OAB/RS 71.231). Pós-graduado em Direito Empresarial pela FGV. Graduado em Contabilidade pela UFRGS
Comments