Um avanço trazido pela reforma trabalhista ainda pouco utilizado.

A Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) passou por relevantes alterações com a reforma trabalhista de 2017 (Lei nº 13.467/2017), dentre as quais se destaca a introdução do artigo 484-A, que regulamenta a possibilidade de rescisão do contrato de trabalho por acordo entre empregador e empregado. Essa modalidade visa conferir maior flexibilidade às partes, evitando disputas judiciais e possibilitando a formalização de encerramento do vínculo empregatício de uma forma mais equilibrada.
O artigo 484-A da CLT representa um avanço ao reconhecer que a relação de trabalho pode ser encerrada de maneira consensual, diferindo das tradicionais formas de desligamento, como a dispensa sem justa causa, a dispensa por justa causa e o pedido de demissão. Neste contexto, este artigo explora os principais aspectos legais, as vantagens e desvantagens dessa modalidade de rescisão para empregadores e empregados, bem como suas possíveis implicações jurídicas e interpretativas.
O que diz o artigo 484-A da CLT?
O artigo 484-A estabelece que o contrato de trabalho pode ser encerrado por comum acordo entre as partes, desde que observadas algumas condições específicas em relação às verbas rescisórias. O texto da lei define que, nesta modalidade de rescisão, o empregado terá direito a:
Metade do aviso prévio, caso indenizado;
Metade da multa sobre o saldo do FGTS, que, em vez dos habituais 40%, será reduzida para 20%;
Saque de até 80% do saldo do FGTS;
Demais verbas rescisórias integrais, como férias vencidas e proporcionais, acrescidas de um terço constitucional, e 13º salário proporcional.
Um ponto fundamental é que, nesta modalidade de rescisão, o empregado não terá direito ao seguro-desemprego, pois o benefício está vinculado à dispensa sem justa causa e a outras formas de desligamento involuntário.
Finalidade e justificativa da rescisão por acordo
Antes da alteração legislativa, em muitos casos, empregadores e empregados faziam acordos informais, simulando demissões sem justa causa para que o trabalhador pudesse sacar o FGTS e obter o seguro-desemprego. Essa prática, além de irregular, poderia gerar riscos jurídicos para ambas as partes.
Com a inserção do artigo 484-A na CLT, a legislação passou a permitir uma negociação formal que beneficia tanto empregadores quanto empregados, conferindo segurança jurídica e previsibilidade às rescisões acordadas. Essa mudança também atendeu aos princípios de flexibilização do mercado de trabalho, um dos objetivos centrais da reforma trabalhista.
Vantagens para o empregado:
Possibilidade de romper o vínculo empregatício sem a necessidade de abrir mão de parte das verbas rescisórias;
Acesso parcial ao saldo do FGTS (até 80%), garantindo um suporte financeiro até conseguir nova colocação;
Evita a necessidade de "acordos informais", minimizando riscos jurídicos e litígios futuros.
Desvantagens para o empregado:
Perda do direito ao seguro-desemprego, um fator relevante para trabalhadores que dependem desse auxílio para sua transição entre empregos;
Redução dos valores rescisórios, principalmente pela limitação a 20% da multa do FGTS e pela possibilidade de aviso prévio indenizado pago pela metade.
Vantagens para o empregador
Redução dos custos com a rescisão, já que a multa do FGTS é reduzida para 20%;
Maior previsibilidade financeira ao encerrar o contrato sem risco de ações trabalhistas relacionadas a dispensas arbitrárias;
Possibilidade de manter uma boa relação com o ex-colaborador, pois o desligamento ocorre de forma negociada e consensual.
Desvantagens para o empregador
Ainda há um custo considerável na rescisão, especialmente em casos de empregados com muitos anos de serviço, onde o saldo do FGTS pode ser elevado;
Potencial resistência de sindicatos ou órgãos fiscalizadores, se detectarem indícios de coação ou fraude no acordo.
Possíveis implicações
Apesar da previsão legal para a rescisão por acordo, algumas questões podem gerar discussões jurídicas e complicações. Entre os principais pontos de atenção, destacam-se:
Ausência de comprovação de que a rescisão foi realmente consensual: caso o trabalhador alegue que foi coagido a aceitar o acordo, isso pode levar a processos trabalhistas questionando a validade da rescisão.
Interpretação dos Tribunais: embora a reforma trabalhista tenha consolidado essa modalidade de desligamento, juízes e tribunais podem analisar casos concretos para verificar se houve abuso ou fraude na aplicação da norma.
Impacto na Previdência Social: o tempo de contribuição para a aposentadoria não será afetado pela modalidade de rescisão em si, mas a falta de acesso ao seguro-desemprego pode prejudicar trabalhadores que dependem desse benefício em momentos de transição na carreira.
Conclusão
A possibilidade de rescisão do contrato de trabalho por acordo, conforme introduzida pelo artigo 484-A da CLT, representa um marco importante para o direito trabalhista brasileiro, trazendo maior flexibilidade e vantajosa previsibilidade tanto para empregadores quanto para empregados. Ao permitir que as partes negociem a saída de forma equilibrada e formal, a legislação minimiza o risco de litígios trabalhistas e promove um modelo mais transparente de desligamento.
No entanto, é fundamental que o acordo seja genuíno e livre de coação, garantindo que os direitos dos trabalhadores não sejam prejudicados. Além disso, é aconselhável que tanto empregados quanto empregadores contem com o apoio de assessorias jurídicas para garantir que o processo rescisório seja conduzido da maneira correta, evitando futuros questionamentos legais.
Embora essa modalidade de rescisão tenha reduzido a informalidade nos desligamentos trabalhistas, cabe aos tribunais analisar eventuais abusos ou fraudes na aplicação da norma. Como toda inovação legislativa, a prática e a jurisprudência continuarão moldando a efetividade desse instituto ao longo do tempo.
Felipe Mendonça
Advogado (OAB/RS 69.083 e OAB/PR 84.256). Doutorando e Mestre em Direito pela Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul.
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